Existe uma preocupação muito grande em relação ao aperfeiçoamento das habilidades vocais, quer sejam cantadas ou mesmo voltadas para a fala. O fato de sermos bombardeados constantemente com programas de calouros, reality shows com seus condidatos a astros vocais (sem falar nos musicais norte-americanos que estão em moda nas grandes metrópoles brasileiras) faz com que a procura por escolas de música, cursos e professores de canto e grupos de teatro especializado em musicais venha ganhando cada vez mais alunos. Escolas de teatro também oferecem cursos voltados para o desenvolvimento da voz no palco, e cursos de oratória e dicção (esses mais raros) também estão na mira de quem quer aperfeiçoar seu instrumento, a voz. Não podemos esquecer de forma alguma os profissionais que cuidam de nosso aparelho fonador, os otorrinolaringologistas e fonoaudiólogos. Todo esse cast de profissionais que fazem com que nossa voz ganhe força, projeção, beleza e expressividade trabalham - cada um com a sua especificidade - a questão da produção vocal.
Porém, existe uma questão muito importante e séria que faz toda a diferença nesse universo da sonorização da voz falada ou cantada: o ouvir. Ouvir em todos os sentidos... não somente escutar. Saber diferenciar as sílabas, as alturas, durações, timbres... saber ouvir e diferenciar as inúmeras possibilidades de produção sonora com a voz. Ouvir não significa simplesmente estar com nossa condição fisiológica saudável, estar com tudo em ordem, com os exames audiométricos em dia. Ouvir é estar aberto a todas as possibilidades sonoras e o significado delas. Estamos falando não só de melodias, canções... mas palavras. O que cada uma delas pode carregar no que se refere a sentimentos, intenções, ou ainda o que está subliminarmente inserido... Simplesmente pelo "Bom dia" de alguém quando falamos ao telefone, já percebemos se realmente está sendo um dia favorável ou somente um momento educado.
Outra situação comum acontece principalmente nos centros urbanos... um caos sonoro envolvendo ruídos dos mais diversos - tráfego intenso, toda sorte de sons mecânicos - interferindo na nossa saúde auditiva e vocal. Somos obrigados a falar muito mais alto na rua, chegando até a gritarmos na tentativa de estabelecermos alguma comunicação. O fato é que nos acostumamos com sons com volume cada vez mais altos e isso se reflete no nosso dia-a-dia. Tendemos a aumentar o volume de nossos aparelhos sonoros... TVs, rádios, aparelhos de som estão cada vez mais sonoros - pra não dizer barulhentos. As festas e baladas tendem a ter um volume de som que chega a nos agredir fisicamente. Questões judiciais envolvendo excesso de barulho entre vizinhos e na vizinhança são cada vez mais comuns... Diante desse emaranhado sonoro, não temos outra situação senão tentarmos conviver com tudo isso, uma vez que não temos "pálpebras auditivas" como preconiza o compositor canadense Murray Schafer em seu livro O ouvido pensante. Infelizmente convivemos com essa realidade e não temos saída, mesmo sabendo que grande parte da população urbana já tem uma considerável perda auditiva, além de dores de cabeça e mau-humores constantes.
Diante dessa situação caótica, notamos que a questão da escuta também está comprometida... e é a escuta no sentido mais completo. Por uma questão de preservação ou algo que o valha, tendemos a escutarmos mas não compreendermos o que nos é dito !!!! Cada vez mais temos que dispender mais e mais energia para que possamos ser ouvidos e compreendidos. Basta observar a quantidade de mal-entedidos entre as pessoas no nosso dia-a-dia. Enfim...
Toda essa discussão nos leva a levantarmos algumas questões: Estamos atentos à nossa percepção auditiva no nosso dia-a-dia? Temos consciência do quanto nossa audição é importante para uma boa convivência e qualidade de vida? Será que compreendemos que para um bom resultado de trabalho vocal precisamos ter a percepção auditiva melhor estimulada?